Último romance de Cesare Pavese, publicado pouco antes do seu suicídio, A Lua e as Fogueiras (1950) é considerado quase unanimemente como o mais belo trabalho do autor italiano. É um livro dual e quase antitético: de uma complexidade simples, de uma profundeza laminar, é passado e presente, é tristeza e esperança, é identidade anónima.
Livro carregado de imagens de potencial lírico extremo, A Lua e as Fogueiras confunde-se, por vezes, com um longo poema narrativo em que, mesmo na tradução portuguesa de Manuel de Seabra, se ouve o cantante da língua italiana. Chega a ser hipnótico o ritmo da prosa que os capítulos curtos tentam quebrar, deixando o leitor num leve transe contemplativo de uma cruel paisagem bucólica transalpina. Todavia, qualificar este livro de lírico seria, para além de errado, perigoso: seria despir de Nuto toda a sapiência e força, de Cinto toda a esperança, e de Santa, personagem quase ausente durante a maior parte da narração, aquela indizível qualidade encantatória que só as mulheres belas e tempestuosas possuem. Logo, A Lua e as Fogueiras é um romance, de pleno direito no modo narrativo, sem deixar de ser levemente pintado pela lírica inerente à lua e ao fogo, e aos montes e à neve, e ao trabalho justo e à riqueza, e à paixão e ao belo e à morte, e, no fundo, à Itália. A Lua e as Fogueiras marca, como os restos da fogueira marcam o solo, tornando-o fecundo, e é uma obra-prima na bibliografia de Cesare Pavese e da literatura mundial