pega num pedaço de céu e mete-o numa panela grande,
que possa levar ao lume do horizonte;
depois mexe o azul com um resto de vermelho
da madrugada, até que ele se desfaça;
despeja tudo num bacio bem limpo;para que nada reste das impurezas da tarde.
por fim, peneira um resto de ouro da areia
do meio-dia, até que a cor pegue ao fundo de metal. (...)
Nuno Júdice, Receita para fazer o azul
Nas fotografias de Maria Irene Crespo, Inês Pedrosa descobriu, menina e moça, a beleza dos escombros, o amor pelos resíduos obscuros do quotidiano, a alegria que existe no fundo da memória da tristeza e, sobretudo, o exercício da liberdade criativa, A partir das fotografias de Maria Irene Crespo, Inês Pedrosa inventou uma história de amizade circulando em torno das imagens, uma história que é uma homenagem à forma de fotografar (is é, de ser) de Maria Irene Crespo e uma passagem de testemunho sobre as focagens e desfocagens do coração que Inês Pedrosa aprendeu com ela. A profissão de Maria Irene Crespo é outra (médica especialista em ginecologia e obstetrícia), e estas fotografias não foram feitas para expor nem para provar nada; durante décadas, circularam em álbuns na privacidade do olhar dos amigos e da família, até que uma editora encontrou nelas essa intensidade livre que contagiou a minha infância, e se propôs publicá-las.