segunda-feira, 26 de maio de 2014

Fisica no dia-a-dia, de Rómulo de Carvalho

Fisica no dia-a-dia, de Rómulo de Carvalho - TSF

Livre Pensamento - Carlos Fiolhais

Livre Pensamento (I)

«Há palavras que nos beijam»

«Há palavras que nos beijam» - TSF


A jornalista Rita Costa  lê de Alexandre O'Neill,  o poema «Há palavras que nos beijam».

Como se tivessem boca, Palavras de amor, de esperança, De imenso amor, de esperança louca.

Palavras nuas que beijas/Quando a noite perde o rosto, Palavras que se recusam Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas Entre palavras sem cor, Esperadas, inesperadas/Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama/Letra a letra revelado/No mármore distraído, No papel abandonado)

Palavras que nos transportam Aonde a noite é mais forte, Ao silêncio dos amantes/Abraçados contra a morte

domingo, 25 de maio de 2014

«Canto Nono»

«Canto Nono» - TSF


De «O Mel», de Tonino Guerra, o jornalista Fernando Alves lê o poema «Canto Nono».

Terá chovido durante cem dias e a água infiltrada/pelas raízes das ervas/chegou à biblioteca banhando as palavras santas/guardadas no convento.

Quando tornou o bom tempo, Sajat-Novà o frade mais jovem/levou os livros todos por uma escada até ao telhado/e abriu-os ao sol para que o ar quente/enxugasse o papel molhado.

Um mês de boa estação passou/e o frade de joelhos no claustro/esperava dos livros um sinal de vida. Uma manhã finalmente as páginas começaram/a ondular ligeiras no sopro do vento/parecia que tinha chegado um enxame aos telhados/e ele chorava porque os livros falavam.

sábado, 24 de maio de 2014

«Pastelaria»

«Pastelaria» - TSF

 oOjornalista Hugo Neutel lê o poema «Pastelaria», de Mário Cesariny.

Afinal o que importa não é a literatura/nem a crítica de arte nem a câmara escura/Afinal o que importa não é bem o negócio/nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio/Afinal o que importa não é ser novo e galante - ele há tanta maneira de compor uma estante!

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício/e cair verticalmente no vício/Não é verdade rapaz? E amanhã há bola/antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome/porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo/de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente: Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é por ao alto a gola do peludo/à saída da pastelaria e, lá fora - ah, lá fora! - rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta/ter lavados e muitos dentes brancos à mostra.

sexta-feira, 23 de maio de 2014

«Sísifo»

«Sísifo» - TSF



Da obra «Diário XIII», de Miguel Torga, a jornalista Bárbara Baldaia lê o poema «Sísifo»

Recomeça... Se puderes, Sem angústia e sem pressa. E os passos que deres, Nesse caminho duro/Do futuro,/Dá-os em liberdade. Enquanto não alcances/Não descanses. De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado, Vai colhendo/Ilusões sucessivas no pomar/E vendo/Acordado, O logro da aventura. És homem, não te esqueças! Só é tua a loucura/Onde, com lucidez, te reconheças.

«Tríptico»

«Tríptico» - TSF

O jornalista José Carlos Barreto lê «Tríptico», um poema de Herberto Helder.

Não sei como dizer-te que minha voz te procura/e a atenção começa a florir, quando sucede a noite/esplêndida e vasta. Não sei o que dizer, quando longamente teus pulsos/se enchem de um brilho precioso/e estremeces como um pensamento chegado. Quando, iniciado o campo, o centeio imaturo ondula tocado/pelo pressentir de um tempo distante, e na terra crescida os homens entoam a vindima - eu não sei como dizer-te que cem ideias, dentro de mim, te procuram. Quando as folhas da melancolia arrefecem com astros/ao lado do espaço/e o coração é uma semente inventada/em seu escuro fundo e em seu turbilhão de um dia, tu arrebatas os caminhos da minha solidão/como se toda a casa ardesse pousada na noite.

- E então não sei o que dizer/junto à taça de pedra do teu tão jovem silêncio. Quando as crianças acordam nas luas espantadas/que às vezes se despenham no meio do tempo - não sei como dizer-te que a pureza, dentro de mim, te procura. Durante a primavera inteira aprendo/os trevos, a água sobrenatural, o leve e abstracto/correr do espaço -

e penso que vou dizer algo cheio de razão, mas quando a sombra cai da curva sôfrega/dos meus lábios, sinto que me faltam/um girassol, uma pedra, uma ave - qualquer/coisa extraordinária. Porque não sei dizer-te sem milagres/que dentro de mim é o sol, o fruto, a criança, a água, o deus, o leite, a mãe, o amor, que te procuram.



quinta-feira, 22 de maio de 2014

Conta-Me História - Transferência da Corte para o Brasil


Conta-me História - Terramoto de 1755


Conta-me História - Descobrimento do Brasil


Conta-me História - Restauração da independência


Conta-me História - Regeneração


Conta-me História - Implantação da República


Conta-me História - Fundação de Portugal


Minha cabeça estremece - Herberto Hélder // Rodrigo Leão


«O Poema Original»

«O Poema Original» - TSF

 Ana Bravo, retirou da prateleira o livro «Resumo», de José Carlos Ary dos Santos, e disse «O Poema Original».

Original é o poeta/que se origina a si mesmo/que numa sílaba é seta/noutra pasmo ou cataclismo/o que se atira ao poema/como se fosse ao abismo/e faz um filho às palavras/na cama do romantismo.
Original é o poeta/capaz de escrever em sismo.
Original é o poeta/de origem clara e comum/que sendo de toda a parte/não é de lugar algum.
O que gera a própria arte/na força de ser só um/por todos a quem a sorte/faz devorar em jejum.
Original é o poeta/que de todos for só um.
Original é o poeta/expulso do paraíso/por saber compreender/o que é o choro e o riso; aquele que desce à rua/bebe copos quebra nozes/e ferra em quem tem juízo/versos brancos e ferozes.
Original é o poeta/que é gato de sete vozes.
Original é o poeta/que chega ao despudor/de escrever todos os dias/como se fizesse amor.
Esse que despe a poesia/como se fosse mulher/e nela emprenha a alegria/de ser um homem qualquer.

quarta-feira, 21 de maio de 2014

«Fala do velho do Restelo ao astronauta»

«Fala do velho do Restelo ao astronauta» - TSF


A jornalista Clara Osório folheou o livro «Os poemas possíveis», de José Saramago, e escolheu o poema «Fala do velho do Restelo ao astronauta» do Prémio Nobel da Literatura,

Aqui, na Terra, a fome continua, A miséria, o luto, e outra vez a fome.

Acendemos cigarros em fogos de napalme/E dizemos amor sem saber o que seja. Mas fizemos de ti a prova da riqueza, E também da pobreza, e da fome outra vez. E pusemos em ti sei lá bem que desejo/De mais alto que nós, e melhor e mais puro.

No jornal, de olhos tensos, soletramos/As vertigens do espaço e maravilhas: Oceanos salgados que circundam/Ilhas mortas de sede, onde não chove.

Mas o mundo, astronauta, é boa mesa/Onde come, brincando, só a fome, Só a fome, astronauta, só a fome, E são brinquedos as bombas de napalme.

terça-feira, 20 de maio de 2014

«Identidade»

«Identidade» - TSF


Em "Raiz de Orvalho e Outros Poemas", Mia Couto escreveu «Identidade», poema  lido pela jornalista Gabriela Batista.

Preciso ser um outro/para ser eu mesmo

Sou grão de rocha/Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando/o sexo das árvores

Existo onde me desconheço/aguardando pelo meu passado/ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro/no mundo por que luto nasço

segunda-feira, 19 de maio de 2014

«Saudade»

«Saudade» - TSF


A escolha de Miguel  passou pelo poeta Gilberto Vasconcelos.

Eu tenho dentro de mim, tenho dentro do peito, uma saudade, que enfim, me esquece o que tens feito.

Eu tenho dentro de mim, tenho cá dentro em verdade, aquela saudade, enfim, do que me deste em saudade.

Esta saudade, saudade, esta saudade sem fim/como eu a tenho em verdade/bem dentro, dentro de mim,

é talvez, só a verdade/que deva sair de mim/em bem estranha saudade.

domingo, 18 de maio de 2014

«Esta Gente»

«Esta Gente» - TSF


Publicado no livro "Geografia", o poema «Esta Gente», de Sophia de Mello Breyner Andresen, foi o escolhido pela jornalista Ana Lemos

Esta gente cujo rosto/Às vezes luminoso/E outras vezes tosco

Ora me lembra escravos/Ora me lembra reis

Faz renascer meu gosto/De luta e de combate/Contra o abutre e a cobra/O porco e o milhafre

Pois a gente que tem/O rosto desenhado/Por paciência e fome/É a gente em quem/Um país ocupado/Escreve o seu nome

E em frente desta gente/Ignorada e pisada/Como a pedra do chão/E mais do que a pedra/Humilhada e calcada

Meu canto se renova/E recomeço a busca/De um país liberto/De uma vida limpa/E de um tempo justo

sábado, 17 de maio de 2014

Nós os portugueses


«Velhos de Lisboa»

«Velhos de Lisboa» - TSF

Alexandre O"Neill, «Velhos de Lisboa».

Em suma: somos os velhos, cheios de cuspo e conselhos, velhos que ninguém atura/a não ser a literatura/E outros velhos. (os novos/ afirmam-se por maus modos com os velhos). Senectude/é tempo não é virtude... Decorativos? Talvez... Mas por dentro "era uma/Vez..." Velhas atrozes, saídas/de túgurios impossíveis, disparam, raivoso, o dente/contra tudo e toda a gente. Velhinhas de gargantilha/visitam o neto, a filha, e levam bombons de creme ou palitos "de la reine". A ler p"lo sistema Braille/Ó meus senhores escutai! um velho tira dos dedos/profecias e enredos. Outros mijam, fazem esgares, têm poses e vagares/bem merecidos. Nos jardins, descansam, depois, os rins.

Aquele outros (os coitados!)/imaginam-se poupados/pelo tempo, e às escondidas/partem p"ra novas sortidas... Muito digno, o reformado/perora, e é respeitado/na leitaria: "A mulher/é em casa que se quer!" Velhotes com mais olhinhos/que tu, fazem recadinhos, pedem tabaco ao primeiro/e mostram pouco dinheiro... E os que juntam capicuas/e fotos de mulheres nuas? E os tontinhos, os gaiteiros, que usam cravo e põem/cheiros?/(velhos a arrastar a asa/pago bem e vou a casa)/E a velha que se desleixa/e morre sem uma queixa? E os que armam aos pardais/Nessas hortas e quintais?/(Quem acerta co"os botões/deste velho? Venha a cidade/ajudá-lo a abotoar/que não faz nada de mais!)/

Velhos, ó meus queridos/velhos, saltem-me para os joelhos: vamos brincar?

sexta-feira, 16 de maio de 2014

Nós os portugueses


José Saramago

Alexandre O' Neill, poeta e publicitário

Valter Hugo Mãe entrevista Álvaro Magalhães


António Gedeão





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António Gedeão (1906-1997)

«O Presente Absoluto»

«O Presente Absoluto» - TSF


 Ana Catarina Santos  o poema «O Presente Absoluto», de António Ramos Rosa.



Duas bocas descobrem o veludo incandescente/e saboreiam o sabor perfeito de um fruto liso/que é um sumo do universo. Com a sua espuma constante/os amantes tecem uma abóbada leve de seda e espaço. Vivem num volume cintilante o presente absoluto.

Corpos encerrados em superfícies delicadas/abrem-se como velas vermelhas e o calor brilha, clareiras acendem-se numa tranquilidade branca, os olhos embriagam-se de miríades de cores/e todos os vocábulos são recentes como o orvalho.

Criam a origem pela origem, num corpo duplo e uno, transformam-se subindo morrendo em verde orgia, inertes renascem de onda em onda radiantes, reconhecem-se no vento que os expande e os dissolve, o mundo é uma brecha, um esplendor, um redemoinho

Amores e Saudades de um Português Arreliado, de Miguel Esteves Cardoso

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